quarta-feira, 3 de agosto de 2011

Para H. C.

E fomos madrugada adentro, gastando tempo com cigarros partilhados, frio consentido, algumas garrafas de vinho tinto e shots de qualquer Bourbon americano. Bom, não era qualquer. O seu preferido, escolhido a dedo três dias antes do seu aniversário. Pra você cowboy, as usual, o meu duas pedrinhas de gelo e só (um pecado misturar com água ainda que sólida, você dizia). Dissertávamos sobre amor, persistências – com pausa para metáfora bíblica e comoção – e, principalmente, como somos diferentes. Um do outro não, dois do resto. Por isso não encaixamos nunca, por isso tantos hiatos. Mas o mundo, graúdo como ele só, ainda há de estabilizar essa dissonância e fazer música uníssona. “Somos tão novos e, apesar de velozes, não temos pressa alguma” divagávamos, absortos da madrugada que morria. Foi quando te falei de um texto meu, inacabado ainda; todo cabeça, zero papel.
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Eu sempre tiro conclusões malucas em ambientes pouco favoráveis (conclusões que, às vezes, só fazem sentido pra mim e que, no final, eu mesma encontro um jeito de discordar). Dessa vez aconteceu parada na calçada, apática, esperando o sinal ficar vermelho para atravessar a avenida. Carro, ônibus, moto, moto, muita moto, mais moto. Verde, ainda verde, verde pra sempre (algum verde tem que ter aqui)... De repente: “amor é digestão, cara”. Amor é d-i-g-e-s-t-ã-o. Isso mesmo: fome, comida, pasto. As pessoas são os alimentos expostos na estante do supermercado, cada um na sua sessãozinha, tudo organizadinho, rótulo visível, letras garrafais. A priori, você se encanta pela embalagem. Ah, como a aparência do produto conta! O sabor pode ser insosso, não importa. Então você escolhe e manda ver. Mastiga, digere, absorve tudo de bom, se nutre e cresce. O excedente é excreto. LIXO. Exatamente isso: você come, aquilo te fortalece, te faz crescer. Suga tudo que de bom há ali, depois elimina o que sobrou, o que não interessa mais. Tudo vira MERDA pra, logo em seguida, você escolher outro e repetir o processo do mesmo jeitinho. Cada organismo reage ao alimento da sua maneira, cada coração tem seu jeito particular de expulsar o sentimento. Mas, no final das contas, é ato sem fim, encenação pura.
E ainda me perguntam por que eu emagreci tanto...




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Tudo mentira.
A verdade é que, se ficarmos sem alimento, a gente morre.





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Eu disse que seria seu, sê-lo é. Dessa vez, o alimento foi por minha conta, receita antiga: papel e caneta. Agora foi vez do chef sentar à mesa e fazer digestão. Devore, querido amigo. Obrigada pelo SEU dia.

quinta-feira, 28 de julho de 2011

rapidinha

A ausência é presença da falta.

e isso me veio à cabeça quando voltava de São Bernardo do Campo, ao ser surpreendida por um longo engarrafamento...

segunda-feira, 18 de julho de 2011

automatismo

Prédio, prédio, prédio, tédio, prédio... Quanta apatia! Deve ser essa cidade, sei lá, engolindo o passado perfeito e atolando de imperfeições meu futuro do pretérito. Presa, em condicional. Presa no condicional. Tanto 'se' e nenhum 'é'. Tudo frustração, nada reação. PREGUIÇA. Quilos de papéis em branco preenchidos de metades. Ta faltando Ins pra tanta piração. Metáforas sem fim, poesia inacabada. Escrever lixo é luxo, opto pela inércia. É tanta falta, impedimento de estar, por isso, mesmo não sendo juíza de mim, estendo o cartão vermelho. I´m out, na rua, perambulando tão não eu por essa são paulo tão não minha. Observando esses milhares de apartamentos superlotados de solidão. Fingindo presença, sempre em boas más companhias. Todos com as testas franzidas, como quem anseia enxergar além. E os órgãos em extrema putrefação. Fígado, pulmões, coração, às moscas, tudo. Agora é démodé conservá-los, caiu em desuso. Cafonice pura, broxante como calcinha bege de vó. A partir de hoje, sou hype. A partir de hoje, opto pela frigidez (sentimental, sexual e literária).



segunda-feira, 25 de abril de 2011

desabafo

Hoje me machuco, batendo, matando. A voz passiva também se aplica ai. Mato as lembranças, o meu corpo tá com marcas. Dores psicológicas, ferindo bem mais que o sentir. Eu tou estragada, fruto podre. Mexendo na ferida exposta. Tenho roxos pelo corpo, meu estômago dói pela falta de alimento. Meu coração dói pela falta de alimento. Reorganizar, organizar-me. Todo esse caos ta impossível. Ta tudo uma bagunça, não sei por onde começar. Lixo humano, azedume expoente. Tudo ta demais. Pessoas demais, noite demais, êxtase demais. Tou em transe. FRÍGIDA. Com o pulso fraco e a respiração ofegante. D-O-P-A-D-A. A cidade baixa me pegou, escuridão. Esfaqueando a inocência, machucada e machucando. Me quero de volta, arremessei do 5º andar. Foi só alma, estatelou-se muda, leve, longe. O corpo em decomposição permaneceu. A podridão só aumentou. Tenho medo, consequências acontecem, pensamento prévio não. Tou morrendo, me matando. Doente, acabada. No limiar da loucura, acordei chorando. Masoquismo escroto, fase negra que não passa. Madrugada que não finda. Há luz, há lírios. Quero a pureza de volta, minha alma que morreu. Clamo por clemência, resgate que não vem. Meu presente me condena: prisão perpétua, solitária.